O caráter do servo a quem o Senhor usa

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Philippians 2:19–24 ARA
Espero, porém, no Senhor Jesus, mandar-vos Timóteo, o mais breve possível, a fim de que eu me sinta animado também, tendo conhecimento da vossa situação. Porque a ninguém tenho de igual sentimento que, sinceramente, cuide dos vossos interesses; pois todos eles buscam o que é seu próprio, não o que é de Cristo Jesus. E conheceis o seu caráter provado, pois serviu ao evangelho, junto comigo, como filho ao pai. Este, com efeito, é quem espero enviar, tão logo tenha eu visto a minha situação. E estou persuadido no Senhor de que também eu mesmo, brevemente, irei.

Introdução

O contexto

Ao longo da carta aos Filipenses, vemos como os irmãos de Filipos, apesar de serem cristãos fiéis e da igreja ser uma igreja saudável, estavam enfrentando tentações que ameaçavam a firmeza e alegria deles na fé. Ao longo da carta, vemos pelo menos três aspectos em que os filipenses estavam sendo tentados ou ameaçados na caminhada em Cristo:
Esmorecerem ou serem intimidados pelas perseguições que Paulo e eles mesmos estavam enfrentando (Fp. 1:28);
Cairem em partidarismos e vanglória (Fp. 2:3, 3:19);
Pela presença de falsos mestres judaizantes (Fp. 3:2);
Pela presença de falsos irmãos mundanos no meio da igreja (Fp. 3:19).
Diante dessas tentações, no texto diante de nós, vemos o cuidado de Paulo com os irmãos de Filipos. Paulo deseja ter certeza de que esses irmãos estão realmente firmes na fé e para isso, espera enviar Timóteo até eles. Notem como Paulo expressa no versiculo 19 sua esperança e seu objetivo ao enviar Timóteo.

A esperança de Paulo

Paulo afirma que espera no Senhor enviar Timóteo o mais breve possível. Notem que o texto começa com um “espero, porém”. Nos versículos anteriores, desde o versiculo 17, Paulo levanta uma hipótese para manifestar o seu desejo de que os filipenses permanecessem firmes e fieis na fé, operando a salvação deles com temor e tremos e vivendo de modo irrepreensível nesse mundo. Para isso, ele afirma que, se eles vivessem dessa forma, ainda que Paulo sofresse a morte, ele se alegraria diante da fé dos filipenses e, por isso, os irmãos em Filipos deveriam se alegrar com Paulo mesmo diante da incerteza da situação dele - ainda que eles não soubessem se Paulo viveria ou morreria, eles deveriam se alegrar com ele.
Mas no versículo 19, Paulo afirma que, apesar disso, ele espera - tem esperança de - enviar Timóteo o mais breve possivel. Paulo quis dirigir os filipenses a se alegrarem não numa esperança incerta de ele ser liberto; ele sabia que isso poderia não acontecer. Mas, agora que a alegria dos filipenses já havia sido colocada onde deveria estar - na graça e esperança da vida eterna em Cristo - Paulo manifesta o que esperava que acontecesse: ele esperava poder enviar Timóteo e que ele mesmo, brevemente, iria (v. 24).
O envio de Timóteo é um sinal da esperança de Paulo porque, como vemos no versículo 23, Paulo esperava enviá-lo assim que tivesse “visto sua situação” - ou seja, assim que tivesse uma definição mais clara do que aconteceria com ele. Paulo esta dizendo que espera que logo terá uma definição da sua situação e poderá enviar Timóteo para compartilhar essa definição com os filipenses.

O objetivo de enviar Timóteo

Mas mais do que enviar Timóteo para levar notícias a respeito de si, Paulo tinha um desejo bem específico ao enviar Timóteo: Paulo desejava enviar para que ele fosse animado ao saber da situação dos filipenses. Paulo desejava que Timóteo fosse até Filipos para que ele tivesse conhecimento da situação dos filipenses e, mais ainda, como veremos, auxiliasse os irmãos a cumprirem aquilo que Paulo os exortou a fazer na carta; ao fazer isso, Timóteo poderia voltar e relatar o estado dos filipenses para Paulo, e ele se sentiria consolado e animado ao receber boas notícias da igreja em filipos.
Como vimos, apesar de ser uma igreja saudavel, os irmãos em Filipos tinham tentações, falsos mestres e falsos irmãos que ameaçavam a firmeza deles na fé, mas com a ida de Timóteo, Paulo esperava que esses irmãos seriam auxiliados e fortalecidos e, assim Timóteo voltaria trazendo boas notícias e Paulo se alegraria.

O caráter do servo que o senhor usa

No restante dessa passagem, o que Paulo faz, basicamente, é demonstrar porque ele envia especificamente Timóteo até os irmãos. O que Paulo afirma sobre Timóteo demonstra para nós o caráter do servo a quem o Senhor usa. É isso que ele faz nos versículos 20 a 22. Notem novamente no texto:
Filipenses 2:19-22 “Espero, porém, no Senhor Jesus, mandar-vos Timóteo, o mais breve possível, a fim de que eu me sinta animado também, tendo conhecimento da vossa situação. Porque a ninguém tenho de igual sentimento que, sinceramente, cuide dos vossos interesses; pois todos eles buscam o que é seu próprio, não o que é de Cristo Jesus. E conheceis o seu caráter provado, pois serviu ao evangelho, junto comigo, como filho ao pai.”
Paulo afirma que deseja enviar Timóteo e logo em seguida apresenta os motivos para isso. E, conforme nos debruçamos sobre essa passagem, veremos que o Paulo aponta aqui não são simplesmente traços de caráter secundários, mas fundamentais para alguém ser usado pelo Senhor.

Por que Timóteo (O caráter do servo a quem o Senhor usa)

Paulo apresenta dois motivos pelos quais deseja enviar especificamente a Timóteo até os irmãos:
A forma única como Timóteo servia a Deus e aos irmãos (v. 20-21);
O caráter provado de Timóteo (v. 22).

A forma única como Timóteo servia o Senhor e aos irmãos ()

O sentimento raro (que, sinceramente, cuide dos vossos interesses)

O primeiro motivo que Paulo apresenta é disposição única de Timóteo para servir a Cristo e aos irmãos. Paulo afirma que deseja enviar Timóteo “porque a ninguém tem de igual sentimento, que sinceramente, cuide dos vossos interesses, pois todos eles buscam o que é seu próprio, não o que é de Cristo Jesus”.
Diferentemente de todas demais pessoas a disposição de Paulo, Timóteo era o único que, sinceramente cuidava dos interesses dos filipenses e buscava aquilo que é de Cristo.
É impossível ler essa passagem e não lembrar o que Paulo chamou os cristãos a fazerem mais cedo na carta:
Filipenses 2:4 “Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros.”
Timóteo era um exemplo vivo de alguém que fazia aquilo que Paulo chama os filipenses a fazerem. Notem as palavras que Paulo uso para descrever a disposição de Timóteo:

Sinceramente

Timóteo não simplesmente afirmava buscar os interesses dos filipenses, mas fazia isso com sinceridade. Ele não simplesmente afirmava buscar os interesses dos filipenses, ou fazia algumas coisas que eram do interesse dos filipenses, mas ele sinceramente cuidava dos interesses deles;

Cuidado

O texto diz que Timóteo "cuidava” dos interesses dos filipenses. A palavra usada para cuidar aqui é marcante: literalmente, é a palavra “ansiedade”. Essa é a mesma palavra que Paulo usa na própria carta aos filipenses para dizer: “Nao andeis ansiosos de coisa alguma” (Fp. 4:6). Mas há uma razão pela qual os tradutores utilizaram a palavra “cuidar” ao invés de “ter ansiedade”.
Há um tipo de ansiedade que é pecaminosa: um medo sem fé que despreza a providência de Deus e que reflete um amor idólatra por algo que não é Deus. Mas há uma ansiedade, um cuidado, que não só é consistente com a fé como é agradável a Deus: um desejo e preocupação com aquilo que agrada a Deus e o bem de nossos irmãos; um desejo e preocupação que são frutos da fé em Cristo, de nos preocuparmos com as coisas do alto; um desejo e preocupação que confia em Deus para cuidar de todas as coisas e que trabalha a luz disso. O texto se refere a esse tipo de ansiedade, esse cuidado cheio de fé por algo que agrada a Deus, e por isso a palavra usada na tradução é cuidar.
Eu posso ter medo de que meu filho vá rolar e cair da cama, bater a cabeça e sofrer algum trauma físico ou até mesmo morrer. Mas existe uma diferença entre:
eu (1) temer isso e ficar angustiado, aflito como se minha vida fosse ser arruinada caso isso acontecesse, como se isso jamais pudesse acontecer ou eu não supotaria e (2) eu temer por isso por crer em Deus e saber que a morte e a dor existem num mundo caído e ele me deu sabedoria e a responsabilidade de cuidar do meu filho;
eu (1) temer isso como se algo assim jamais pudesse acontecer e ter um propósito, como se não existisse um Deus bom, sábio e soberano sobre todas as coisas do universo e (2) eu temer isso por amor a meu filho como dado por Deus, mas confiando e descanso que Deus é sábio, soberano e cuida de todas as coisas e, se ele permitir algo do tipo, ainda que eu não entenda, ele terá um bom e sábio propósito em todas as coisas;
Eu (1) temer isso como se Deus não tivesse completo direto de fazer como quer com os anjos no céu e com os homens na terra, meu filho incluso, e (2) eu temer me submetendo com confiança como de uma criança a Deus, reconhecendo que ele é Deus, sábio, bom, soberano e livre sobre todas as coisas.
Timóteo tinha uma sincera ansiedade, um sincero cuidado, pelos interesses dos irmãos. Ele se preocupava que eles permanecessem firmes na fé, livres de divisões e falsas doutrinas, vivendo de modo digno do Senhor e cheio de alegria em Cristo. Ele se preocupava com isso e desejava trabalhar para isso.

Dos vossos interesses

Note, por fim, pelo que Timóteo tinha cuidado: pelos interesses dos filipenses. É interessante notar a relação entre os versículos 20 e 21. Paulo afirma que não havia ninguém que cuidasse sinceramente dos interesses dos filipenses, isso porque as outras pessoas cuidavam dos seus próprios interesses e não dos de…? De quem? Seria de se esperar que ele dissesse: “todos buscam o que é seu próprio, e não o que é do seu próximo”, mas ao invés disso Paulo diz: “pois todos buscam o que é seu próprio, não o que é de Cristo Jesus”.
Quando Paulo fala a respeito de buscar os interesses dos filipenses ele não está falando sobre Timóteo ir até a igreja, ouvir o que os filipenses desejam e começar a ajustar a igreja para isso. Paulo está falando a respeito de buscar para o meu próximo aquilo que Cristo deseja para ele.
Notem o exemplo de Epafrodito:
Filipenses 2:29-30 “Recebei-o, pois, no Senhor, com toda a alegria, e honrai sempre a homens como esse; visto que, por causa da obra de Cristo, chegou ele às portas da morte e se dispôs a dar a própria vida, para suprir a vossa carência de socorro para comigo.”
Epafrodito se dispôs a dar a própria vida por causa da obra de Cristo. Ele fez isso por causa de Cristo, não por causa de Paulo. Mas como ele serviu a obra de Cristo e por causa dela aqui? Ele fez isso para levar uma oferta para suprir as necessidades de Paulo. Ele se preocupou com Paulo, com as necessidades físicas e financeiras que Paulo estava passando, mas ele fez isso por causa da obra de Cristo.
Observe também, no início da carta, o que Paulo diz:
Filipenses 1:8 “Pois minha testemunha é Deus, da saudade que tenho de todos vós, na terna misericórdia de Cristo Jesus.”
A saudade que Paulo tinha dos filipenses não era simplesmente uma saudade natural sua, mas era uma saudade na terna misericórdia do próprio senhor Jesus. Sua saudade era um fruto e uma manifestação da misericórdia do próprio senhor Jesus.
E a disposição recomendada por Paulo e que Timóteo manifesta não é uma disposição carnal, mundana e humanista de simplesmente agradar o outro, mas um desejo e cuidado sinceros de que meu próximo conheça e viva aquilo que o próprio senhor Jesus deseja.
Como John Piper afirma, “nós vivemos por aquilo que Jesus moreu”. Jesus se entregou para trazer salvação ao seu povo, para santificar àqueles que são salvos, para trazer alegria e esperança eterna aos seus filhos, para trazer a união do seu povo em si mesmo em comunhão, e nós trabalhamos para isso. Nós bucamos aquilo que é de Cristo no bem do nosso próximo. Buscamos os interesses do nosso próximo: buscamos a salvação dos perdidos em Cristo, buscamos a santificação daqueles que estão vivendo em pecado, buscamos o consolo daqueles que estão desanimados, amparamos os fracos, promovemos a unidade, ensinamos os que estão em erro. Isso é buscar o que é de Cristo, e isso é buscar o interesse do nosso próximo.
Aplicação: É assim que você serve?
Paulo apresenta em Timóteo um modelo de serviço. É assim que você serve? Você busca aquilo que é de Cristo? Você olha para seus irmãos ao redor e para os perdidos e seu desejo para eles é que eles tenham e sejam aquilo que Jesus deseja para eles?
É marcante como esse texto corrige erros comuns e opostos em nossos tempos, tanto de pessoas que, em nome de amor ao próximo, desprezam a Cristo, quando aqueles que , em nome de Cristo, desprezam seus irmãos.
Em nome do amor ao próximo desprezam a Cristo
Por um lado, o texto mostra que buscar o interesse do próximo é algo que só existe quando buscamos aquilo que é de Cristo Jesus. Se não buscamos aquilo que é de Cristo Jesus, estamos buscando nossos próprios interesses, mesmo que afirmemos que estamos buscando os interesses do nosso próximo.
Veja, por exemplo, muito do que se tornaram as igrejas que se chamam evangélicas em nossos tempos. Em nome do amor ao próximo falsos mestres afirmam não confrontar as pessoas em suas igrejas; em nome do amor ao próximo falsas igrejas não praticam a disciplina eclesiástica; mas ao fazer isso, essas igrejas deixam de buscar aquilo que é de Cristo Jesus.
Jesus não veio para deixar pecadores confortáveis e felizes consigo mesmos em seus pecados, mas para salvar pecadores dos seus pecados. E ao ignorar tudo que a bíblia ensina a respeito da ira e ódio de Deus contra o pecado e da necessidade de arrependimento e fé, tais igrejas deixa de buscar o que é de Cristo. E, além disso, tais igrejas deixam pessoas perdidas e enganadas nos seus pecados pensando que são cristãs e, assim, essas falsas igrejas e falsos mestres deixam de buscar o que é do maior interesse de qualquer pessoa: sua salvação.
Mas isso não se aplica somente a falsos mestres e falsas igrejas.
Veja também um exemplo prático a nosso próprio respeito. Quantas vezes, em nome do amor ou por temor de homens, somos omissos e não pregamos o evangelho ou não repreendemos um irmão? Deixamos de buscar o que é de Cristo para buscar conforto, popularidade e segurança para nós mesmos. Em nome de um falso amor, não busamos aquilo que Jesus deseja para nosso próximo, mas aquilo que desejamos para nós mesmos.
Em nome do amor a Cristo, desprezam o próximo
Mas esse texto repreende também àqueles que, em nome do amor a Cristo, desprezam seu próximo. Notem que de acordo com o texto, buscar aquilo que é de Cristo produz um sincero interesse naquilo que é do interesse do meu próximo. Você tem buscado aquilo que é de Cristo? Você afirma que tem servido a Cristo? Mas quais interesses dos outros você tem buscado? Qual o nome do irmão que você tem buscado servir? Qual necessidade de um irmão você tem buscado suprir? Perceba que quando servimos a Deus de forma verdadeiramente agradável a ele, servimos a pessoas com nomes e rostos reais, pessoais e presentes, com necessidades reais e presentes, e não simplesmente de forma distante e abstrata.
Nossa igreja tem, pela graça de Deus, crescido em número recentemente. Mas apesar dessa benção, um risco que corremos quando uma igreja começa a crescer é desenvolvermos um visão institucionalizada do serviço cristão. Como se servir a Cristo fosse sinônimo de participar de algum ministério e pronto. Mas aqui está a pergunta: você tem servido com cuidado na mente e coração pelos interesses dos seus irmãos? Ou tem servido como se estivesse participando de uma atividade rotineira ou fazendo um favor para a igreja? Você se preocupa com as necessidades dos seus irmãos de forma sincera e espiritual? Isso se manifesta fora do momento de culto? Ou você serve como se fosse apenas uma obrigação a ser cumprida?
Paulo apresenta em Timóteo um modelo de serviço genuinamente cristão. Servir verdadeiramente a Deus significa me preocupar sinceramente e buscar aquilo que é de Cristo Jesus para o meu próximo. É esse o tipo de serviço que agrada a Deus, mas o que Paulo fala a seguir deixa evidente como esse tipo de serviço é consideravelmente raro.

A raridade de alguém apto para servir a Deus (A ninguém tenho de igual sentimento)

Notem a forma única como Paulo fala de Timóteo. “A ninguém tenho de igual sentimento”, Paulo diz. A palavra traduzida aqui por “de igual sentimento” é, literalmente, de “mesma alma”. A ideia dessa expressão é a de ter a mesma mente, disposição e sentimento.
Paulo tinha a disposição interior, de alma, mente e coração, para servir os filipenses, e Timóteo era o único que tinha esse mesmo sentimento que acabamos de descrever. Todas demais pessoas que estavam à disposição de Paulo para serem enviadas no momento não tinham essa disposição. Ou não a tinham abertamente, ou a tinham apenas de forma exterior e superficial, fingindo buscar os interesses do próximo mas preocupadas apenas consigo mesmas. Vimos um exemplo disso citado por Paulo no capítulo primeiro. Algumas pessoas poderiam parecer piedosas pregando o evangelho num contexto onde poderiam ser perseguidas por causa de Cristo, mas Paulo afirma que algumas dessas pessoas faziam isso “por inveja e porfia, por discórdia e oposição a Paulo” (Fp. 1:15,17).
Notem que Paulo diz “a ninguém tenho”. Ele não estava falando que não existia ninguém assim no mundo. Mas que não havia ninguém, entre aqueles a sua disposição, que professavam a fé em Cristo, que professavam servi-lo, que tivesse essa disposição necessária para servir a Cristo e sua igreja.
Em outras cartas que Paulo enviou da prisão, vemos ele falando a respeito de Lucas, Aristarco e Marcos - pessoas que ele recomenda como irmãos fieis que genuinamente amavam outros irmãos. Mas na carta aos filipenses, conforme vemos na saudação final, nenhum desses irmãos está com ele. E de todas pessoas que ele consegue pensar para enviar a Filipos, nem uma sequer, com exceção de Timóteo, tinha a disposição espiritual necessária para isso.
Isso é chocante. Essa característica necessária, indispensável, para o serviço é uma raridade. É possível ser um cristão professo e não ter essa característica, e ela torna alguém totalmente inapto para servir a Cristo.

O que torna alguém inapto para o serviço cristão (pois todos eles buscam o que é seu próprio)

E diante disso é urgente que saibamos o que faz com que tão poucas pessoas tenham a disposição necessária para poderem servir verdadeiramente a Cristo e a igreja: Paulo afirma que não tinha ninguém como Timóteo, “pois todos eles buscam o que é seu próprio, não o que é de Cristo Jesus”.
O que tornava tantos cristãos professos inaptos para o serviço não era a falta de recursos, retórica, força ou qualquer outra habilidade desses irmãos, mas o que eles buscavam: ao invés de buscarem o que é de Cristo, eles buscavam o que era deles mesmos.
Essas outras pessoas faziam o oposto do que Paulo ordenou aos filipenses. Eles buscavam não o que é do próximo, mas o que era deles mesmos.

A completa impossibilidade de buscar os próprios interesses e servir a Cristo

Notem, então, a completa impossibilidade e oposição entre buscar os próprios interesses e servir a Cristo. Alguém que busca o que é seu próprio, não busca o que é de Cristo; por outro lado, alguém que genuinamente busca o que é de Cristo e do seu próximo, não buscará o que seu.
Esse foi o ensino também de Jesus. Na famosa passagem do sermão do monte, Jesus disse:
Mateus 6:24: Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro, ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas.
É impossível servir a dois senhores; é impossível servir a Deus e qualquer outra coisa ou pessoa, seja a nós mesmos, seja ao dinheiro.
E notem as palavras de Jesus, porque elas descrevem bem o que acontece quando alguém tenta seguir dessa forma e porque essas pessoas são totalmente inaptas para servir a Deus: elas se devotarão e amarão a um senhor e desprezarão e se aborrecerão do outro.
Alguém que busca o que é seu próprio invariavelmente começara a desprezar e se aborrecer de Deus. Talvez não abertamente num primeiro momento, mas com certeza começara a fazer isso. Ela já não será mais devota a Deus: não o buscará com zelo, em oração e na palavra, não buscará obedecê-lo, nem o amará; mas começará a desprezá-lo e se devotar a si mesma, ao dinheiro, ou ao que quer que seja.
Vocês conhecem pessoas assim e talvez haja alguém assim aqui entre nós. É comum encontrarmos alguém que diz amar a Deus, mas quando perguntamos à pessoa se ela é membro de uma igreja, se ela tem buscado o Senhor, se ela tem servido aos irmãos, o que ouvimos é: veja bem, eu amo a Deus, mas domingo é o único dia que tenho para minha família; eu amo a Deus, mas meu trabalho me impede de servir a Deus e buscá-lo; eu amo a Deus, mas não posso perder essa oportunidade;…
Notem que não estou falando aqui de cristãos que se encontram em alguma situação difícil, que traz dificuldades, mas estão buscando sinceramente a Deus e se esforçando com aquilo que está em suas mãos para mudar isso. Mas de pessoas que vivem assim e não se importam realmente com isso. Vivem assim e dão desculpa atrás de desculpa para continuarem vivendo dessa forma.
Mas Paulo apresenta esse grande alerta: não tenho ninguém de igual sentimento porque todos eles bucam o que é seu próprio. Não busque aquilo que é seu próprio. Seguir a Cristo significa tomar a sua cruz, morrer para si mesmo, perder a sua vida por amor a ele.
Aplicação: por que você serve?
Você verdadeiramente tem servido a Deus, ou você ainda vive para si e seus interesses? Se alguém observasse a sua vida, veria uma pessoa dedicada a Cristo, a obra e evangelho do senhor Jesus, ou a si mesmo?
Nós podemos aplicar isso não só no contexto da igreja, mas em cada área de nossas vidas:
Na criação de seus filhos, você busca o que é de Cristo? Irmãs, por que vocês trabalham ou não trabalham fora de casa? É o amor pelo seus filhos, esposo e irmãos que as motivam? Ou é o desejo por uma carreira, independência, viagens?
Irmãos, por que vocês trabalham como trabalham? É por amor pela sua esposa, filhos e igreja? É pelo desejo de contribuir com o avanço do reino de Deus onde estamos e em missões? Ou pela cobiça dos olhos, da carne e pela ostentação das riquezas? Para ter carros, viagens, roupas de certas marcas…?
Por que você serve em um ministério na igreja? É simplesmente pensando em si mesmo, ou buscando servir e edificar a igreja? Você buscar servir da forma que o Senhor Jesus ensina, buscando servir a ele, ou faz o que é certo e agradável para si mesmo e aos próprios olhos?
Mas em especial, isso é aplicável àqueles irmãos que aspiram ao ou estão no ministério. Notem novamente irmãos, buscar seus próprios interesses torna alguém completamente impossibilitado de servir a igreja. Por que você deseja e o que você busca no ministério? Você aspira ao ministério simplesmente porque gosta de falar? Porque gosta da ideia de ter uma posição de autoridade e ensino? Ou você aspira ao ministério por causa de Cristo e porque crê que assim edificará e servirá os irmãos?
Notem essas palavras de Calvino comentando esse texto:
Gálatas, Efésios, Filipenses e Colossenses (Versículos 17 a 24)
À primeira vista pode parecer como se não fosse grande falha alguém buscar seu próprio proveito; mas quão insustentável é tal coisa nos servos de Cristo, pois torna os que se entregam a ela totalmente inúteis. Pois é impossível que o homem que se devota a si próprio se aplique aos interesses da Igreja. […] Disto transparece quão grande entrave é que os ministros de Cristo busquem seus interesses pessoais. Tampouco existe qualquer força nestas desculpas: “Não estou prejudicando a ninguém”; “Também tenho que cuidar de mim mesmo”; “Não sou tão destituído de sentimento que não me sinta impelido a levar em conta minha vantagem pessoal.” Pois você deve renunciar seu próprio direito, caso queira cumprir seu dever; o cuidado com seus próprios interesses não deve ser preferido sobre glória de Cristo, nem mesmo colocado no mesmo nível que ela. Aonde quer que Cristo o chamar, você deve ir prontamente, pondo de lado todas as coisas. Você deve considerar sua vocação de tal forma que desvie todos seus poderes de percepção de tudo quanto porventura o impeça de cumpri-la. Pode estar em seu poder viver em outro lugar com maior opulência; Deus, porém, o ligou à Igreja, a qual lhe propicia apenas um bem moderado sustento; é possível que em outro lugar você tenha mais honra; Deus, porém, lhe destinou uma situação na qual você viverá num estilo humilde; talvez em outro lugar você desfrute de um céu azul, ou de uma região mais agradável; mas é aqui seu lugar designado. É possível que você desejasse conviver com pessoas mais humanas; é possível que se sinta ofendido com sua ingratidão, ou com seu barbarismo, ou orgulho; em suma, pode ser que não simpatize com a disposição ou as maneiras da nação onde se encontra, porém deve relutar consigo mesmo e de certa maneira mortificar as inclinações opostas, para que você mantenha a tarefa que recebeu; porquanto você não é livre, nem se acha à sua própria disposição. Enfim, esqueça a si próprio, caso queira servir a Deus
Isso se aplica a todo cristão: se você estiver buscando o seu próprio proveito, a sua glória ou o seu próprio interesse, você não pode servir a Cristo. E se você deseja servir a Deus, esqueça a si mesmo e tome a sua cruz. Que a sua recompensa, o seu interesse e sua alegria seja, como a de Paulo, servir e conhecer o senhor Jesus e servir e edificar sua igreja.

O caráter provado de Timóteo

E finalmente, mas de modo mais breve, notem o segundo motivo pelo qual Paulo deseja enviar especificamente a Timóteo:
Filipenses 2:22 “E conheceis o seu caráter provado, pois serviu ao evangelho, junto comigo, como filho ao pai.”
Timóteo tinha um caráter provado, e os irmãos de Filipos sabiam disso. Timóteo provavelmente esteve em Filipos ao menos duas vezes, uma com Paulo e outra sozinho. E os irmãos viram como ele serviu ao evangelho junto de Paulo, além de provavelmente terem ouvido a respeito dele em outros momentos.
Notem que Timóteo tinha um caráter “provado” - um caráter que havia passado por testes e se mostrado verdadeiro. Os irmãos sabiam que ele era verdadeiramente fiel.
O caráter de um cristão não é algo que permanece escondido de forma interior, mas que se manifesta conforme somos testados e provados. É impossível ser cristão e isso não se manifestar de algum forma.
E o contexto em que o caráter provado de Timóteo se manifestou foi na forma como ele serviu ao evangelho. Ele, primeiro, e como vimos no ponto anterior, serviu ao evangelho - não a um homem qualquer, não ao apóstolo Paulo, não a si mesmo, mas ao evangelho. E ele fez isso como um filho ao seu pai. Ele o fez de forma fiel, submissa e amável, como um filho ao seu pai.
Novamente, perceba como Paulo não está simplesmente passando um plano de viagem para os irmãos de filipos. Ele está expondo como Timóteo exemplifica e vive da forma como ele exortou os filipenses a viverem.
Aplicação: servindo ao evangelho como filhos aos pais
E aqui irmãos, novamente preciso perguntar: como você tem servido?
Primeiro, àqueles que estão em posição de autoridade, o que vocês buscam daqueles que estão sob sua autoridade? Vocês buscam que eles sirvam a vocês ou ao evangelho? Paulo recomenda Timóteo não por ele o servir, mas por Timóteo servir ao evangelho junto à Paulo.
Mas, de modo geral, àqueles que servem, como você tem servido junto àqueles que são autoridades sobre vocês? Você serve ao evangelho e não a homens? E você serve como um filho ao seu pai, em humildade, submissão, buscando aliviar a carga daqueles que carregam o peso da autoridade sobre você e, em especial, dos nossos pastores? Ou você serve de forma conteciosa, briguenta e cheia de murmuração?

Este é quem desejo enviar

Por fim, Paulo termina esse trecho com essa frase aos filipenses: “este, com efeito, é quem desejo enviar”. É como se Paulo dissesse: eu exortei e admostei vocês a viverem de certa forma, e este é quem espero enviar: alguém que é um exemplo vivo e conhecido por vocês, alguém que vive dessa forma como eu os exortei.
Paulo não escolheu Timóteo simplesmente por ele ser confiável para ir e voltar com informações sobre a igreja, mas por ele ser um exemplo vivo daquilo que os filipenses deveriam buscar. Paulo esperava que o exemplo de Timóteo encorajasse os cristãos em filipos. Ele desejava que os cristãos em filipos não apenas ouvissem sua mensagem e a tratassem como um ideal de vida inalcançável, mas que reconhecessem a possibilidade de viverem de tal forma e buscassem isso.
Aplicação: encorajamento a uma vida cristã de piedade e serviço
Irmãos, como você tem recebido a palavra? Ao longo dos meses temos ouvido a palavra de Deus ensinada e ouvimos o chamado da carta aos filipenses à humildade, ao serviço e amor abnegado e à coragem e perseverança no evangelho. Você tem buscado e colocado a palavra em prática?
Temo que em uma grande medida tenhamos nos conformado a esse mundo. Faltam-nos, muitas vezes, exemplos de homens e mulheres piedosos em sua vida. Olhamos ao nosso redor e vemos as vezes poucos que vivem da forma como ouvimos aqui. E começamos a achar que a vida cristã é assim mesmo, que sabemos o que deveríamos fazer mas que isso não é possível.
Mas em Timóteo Paulo demonstra que é possível vivermos a vida cristã em verdadeira piedade e amor. Mais do que isso, Paulo ensina que se não vivermos dessa forma não temos como ter qualquer utilidade no serviço a Cristo e aos irmãos.
Aplicação: o interesse de Cristo
Mas notem que Paulo apresentou não só um exemplo, mas o meio, o consolo, a motivação e a base na qual podemos ser transformados em verdadeiros servos do senhor.
Lembrem-se que buscar os interesses do próximo significa buscar os interesses de Cristo. O que isso quer dizer é que Jesus tomou a nossa salvação, santificação e piedade no seu próprio interesse. Quando buscamos a santificação, o consolo, a alegria, a piedade em nossas vidas e de nossos irmãos, não estamos tentando obter algo que talvez Jesus não queira nos dar, mas estamos buscando aquilo que Jesus comprou, garantiu e com certeza dará a nós.
Pensem no que ouvimos. Quão raro é o interesse e cuidado sincero com aquilo que é de Jesus Cristo e do nosso próximo! A raridade da busca sincera pelas coisas de Cristo no bem do nosso próximo reflete claramente a condição perdida da humanidade. Todos nascemos naturalmente egoístas, egocêntricos e sem amor pelo próximo. Mas em meio a tamanha escuridão de pecado, que incrível prova do amor de Deus ouvir que buscar o interesse do nosso próximo é sinônimo de buscar o que é de Cristo - o interesse do nosso próximo é de Cristo!
Se você está aqui e você vive para si mesmo, buscando seus próprios interesses, desprezando a Cristo e ao seu próximo, você está perdido e não é salvo. Mas Jesus, sendo você ainda pecador, buscou o seu interesse! Antes de qualquer um de nós sequer ter ouvido a respeito dele, ele, sendo Deus, se fez homem, se humilhou para servir a pecadores. Ele se entregou para morrer na cruz para se apresentar a Deus como sacrifício pelo pecado. Ele sofreu e morreu para salvar pecadores. E ele ressuscitou e é vivo e poderoso para salvar você. Não saia daqui vivendo para si mesmo. Busque o senhor Jesus. Busque a alguém da igreja que possa te ajudar, ensinar e dirigir a Cristo. Mas não saia daqui vivendo para si mesmo ainda.
Jesus buscou os interesses do seu próximo. Ele tomou como seu próprio interesse a salvação do seu povo e se entregou por nós. Ele fez isso para salvar aqueles que estão perdidos, santificar os que vivem em pecado, trazer a alegria da salvação aos que estão condenados, esperança aos que veem esse mundo perdido. Jesus morreu na cruz e quando somos chamados a pregar o evangelho aos perdidos e a servir os cristãos para que eles sejam santificados, consolados, alegrados, estamos sendo chamados a buscar aquilo que Jesus buscou, conquistou e garantiu ao morrer na cruz.
E quando somos chamados à fé, à santificação, à piedade, ao amor, ao serviço e humildade, somos chamados a reconhecer que isso é o que o próprio senhor Jesus não somente busca, mas garantiu pelo seu sangue que concederá a nós. Ele vai completar a boa obra que iniciou em nossas vidas.
Não se conforme a esse mundo, meu irmão, mas pelas misercórdias do Senhor apresente a si mesmo como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus. Considere o tamanho do amor e misericórdia de Deus em Cristo, e que isso te mova a piedade verdadeira e te torne apto para servir a Deus.
Que Deus conceda um avivamento em nosso meio, fazendo de cada um de nós servos verdadeiros, sinceros e piedosos do senhor Jesus.
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