A parábola do salteador e do pastor das ovelhas (Jo 10.1-21)

As Parábolas de Jesus  •  Sermon  •  Submitted
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Introdução

Encerramos hoje a nossa série sobre as parábolas de Jesus com a exposição desta parábola, a do salteador e do pastor das ovelhas. Ela é contada como uma continuação do que está relatado em João 9 onde um homem cego de nascença fora curado por Jesus, a Luz do Mundo. Este homem é expulso da sinagoga pelos líderes religiosos de Jerusalém (Jo 9.33), pois aquele homem e sua enfermidade foram instrumentos de Deus para o testemunho da obra e pessoa de Cristo.
Diante disso, Jesus faz alusão a uma figura presente na cultura judaica do pastor e das ovelhas – uma quadro vivo na linguagem do AT (Ex.: Sl 23; Ez 34). Deus era o pastor de Israel e Israel era o rebanho do Senhor (Sl 74.1). Jesus agora se identifica como o bom pastor em contraposição aos falsos pastores, e também nos ensina um pouco sobre suas ovelhas. Qual será, portanto, a lição central dessa parábola do nosso Senhor?

I. Recapitulando a parábola.

Jesus destaca a importância da parábola: “em verdade, em verdade” e utiliza a figura de um aprisco. O aprisco era um local de proteção para as ovelhas – essa proteção poderia ser um lugar permanente ou temporário. Durante o frio, as ovelhas eram recolhidas a um aprisco ao anoitecer. Geralmente era construído de pedras com ramagens de roseiras silvestres, (Comentário histórico cultural) e lá elas estavam protegidas do frio, dos ladrões e dos predadores. Os apriscos poderiam ser uma parte do quintal de uma família, sendo cuidada sempre pelo proprietário e pastor das ovelhas, mas era comum também apriscos grandes e independentes, onde várias famílias mantinham suas ovelhas, contratando um “subpastor” para vigiar a porta e, eventualmente, cuidar delas.
Bem, é óbvio que os pastores, os subpastores ou mesmo os porteiros jamais abririam a porta para estranhos, principalmente para ladroes e assaltantes. Por isso, todo aquele que não se aproximava das ovelhas para cuidar delas, porém, com o intuito de se roubá-las, teria de fazê-lo “por outra parte” (vs. 1). E eles precisavam ser muito furtivos, pois as ovelhas não seguiriam estranhos (v. 5). Bem se sabia, e hoje existe comprovação para isso, que as ovelhas fogem dos estranhos. Elas reconhecem uma voz.
Ao contrário deles, o pastor das ovelhas é aquele que entra pela porta (v. 2). Ele vem com a intenção de cuidar de suas ovelhas. Ninguém lhe nega acesso, ele não precisa arrombar as portas nem saltar os muros. Ele é reconhecido pelo porteiro, que lhe abre a porta (v. 3), e pelas ovelhas, as quais guia para fora. Embora muitos apriscos naquela época fossem compartilhados, as ovelhas de uma família não atendiam a voz de outros pastores. Embora no aprisco possam ter muitas rebanhos, o pastor as chama pelo nome e elas atendem. Conforme a tradição, os pastores conheciam cada uma de suas ovelhas e, eventualmente, dava nomes a elas de acordo com suas características (por exemplo, “nevada”).
Parábola contada, o público continua sem entender (v. 6). Como um dos motivos de Jesus ao contar parábolas é distingui o rebanho (Jo 9.39; 10.26), então ele a explica para as suas ovelhas.

II. O que Jesus quer ensinar com a parábola?

Três marcas para o verdadeiro pastor e quatro marcas do falso.

a) Ele é a porta e Ele é a porta (vs. 7 a 9) (A primeira marca do verdadeiro Pastor)

Sim, eu repeti duas vezes. Jesus não quer que você se esqueça disso (vs. 7 e 9). Assim como Jesus quis que se prestasse atenção na parábola, agora ele apresenta que enfática também é a afirmação dele sobre si mesmo: Ele é a porta do aprisco.
Muitos pastores dormiam na porta dos apriscos para garantir a segurança de suas ovelhas. Provavelmente esse é o motivo de Jesus além de se identificar como a porta das ovelhas. Ele é a garantia de entrada e saída em segurança do aprisco. Ele é a fonte de vida abundante. Além disso, Cristo se identifica como a porta pois não há outra forma de entrar no rebanho de Deus senão por ele.

b) O falso pastor é ladrão e salteador (A primeira marca do falso Pastor)

Os ladrões e assaltantes estão mais interessados em tosquiar as ovelhas* do que em guiá-las, alimentá-las e protegê-las, por isso não passam pela porta que é Jesus. Se desviam dele o quanto podem. Eles são os líderes infiéis (que vieram antes de mim). Não são apresentados por Jesus como pastores de fato, mas como “ladrões e salteadores” (vs. 1 e 8).
Aqueles fariseus expulsaram o homem que fora cego da sinagoga. Pensando eles estarem fazendo um ato zeloso em favor da sua posição religiosa, expulsando um “lobo” de seu aprisco, estavam, na verdade, expulsando uma verdadeira ovelha do Senhor Jesus. Os líderes infiéis estavam agindo como destruidores do rebanho. Enquanto pensavam estar excluindo o homem do povo de Deus, o próprio Deus afirma que ele é quem realmente pertence a seu povo.

c) A voz do ladrão é estranha às ovelhas (vs. 5 e 8) (A segunda marca do falso Pastor)

Os líderes infiéis, como aqueles fariseus do capítulo 9, por mais que tentassem, não poderiam atrair as verdadeiras ovelhas de Jesus. Aqueles que vinham com o intuito de desencaminhar as ovelhas não convenciam as verdadeiras ovelhas. Sua voz causa repulsa, medo e estranheza. Aqui entendemos porque as ovelhas de Cristo o seguem: porque sabem distinguir a voz dos pastores dos lobos pela voz. É o discernimento que o crente possui de distinguir a verdadeira doutrina das falsas invenções dos homens.
Um triste alerta é que as ovelhas não são atraídas, mas podem ser dispersas ou atormentadas por falsos pastores, pois:

d) Os falsos pastores matam, roubam e destroem (vs. 10) (A terceira marca do falso Pastor)

Uma das marcas do pastor infiel é a busca por benefício próprio em detrimento das necessidades das ovelhas – Essa é a característica de um ladrão. O ladrão age em benefício próprio, seja para enriquecimento ou para matar a sua fome através da ovelha roubada. Elas servem apenas como um meio para alcançar um status, um domínio, um poder, uma satisfação pessoal.
Essa figura apresentada por Jesus remete fortemente ao juízo de Deus sobre os pastores infiéis de Israel descrito no livro de Ezequiel, capítulo 34. O pastor infiel se alimenta, se veste e se mantem da morte das ovelhas. Cristo não está apontando para os profetas que lhe antecederam (vs. 8), mas para todos aqueles líderes religiosos que massacravam o povo. Enquanto os líderes religiosos sufocavam as ovelhas, Cristo é que lhes dá a vida e em abundância (v. 10).

e) Ele é o bom pastor e Ele é o bom pastor (vs. 11 a 15) (A segunda marca do verdadeiro Pastor)

Sim, Jesus faz novamente uma outra ênfase (vs. 11 e 14). Naquela época haviam pastores auxiliares contratados. Eles não se responsabilizavam pelos ataques sofridos pelos rebanhos de feras selvagens, como lobos.
Enquanto os pastores auxiliares não se responsabilizavam de maneira radical com as ovelhas, visto que não eram suas, e na ameaça de ataque de feras selvagens preferiam resguardar suas próprias vidas do que a das ovelhas, Cristo é o bom pastor pois dá a sua vida por elas. Cristo enfrenta as feras, expulsa os lobos (não os domestica), preserva o rebanho. Se necessário, morre para salvar as suas ovelhas. Essa é a verdade: Ele morre e garante vida as suas ovelhas (vs. 17 – 19). A morte de Cristo não é a morte e um homem por um homem só. Visto que Ele é Deus e não conheceu pecado, sua morte tem poder infinito e ele tem o poder para entregar a sua vida e reavê-la. A morte de um homem gerou vida a milhões de pessoas, sejam judeus ou gentios (vs. 16).

f) O falso pastor é mercenário: não é dono das ovelhas, não expulsa os lobos é abandona as ovelhas (vs. 12) (A quarta marca do falso Pastor)

Pastores auxiliares infiéis podiam ser mercenários. Eles trabalhavam não por amor as ovelhas, mas por remuneração. Não havia preocupação real com as ovelhas, pois elas não eram suas. O falso pastor tem uma última característica lastimável: ele não expulsa os lobos. Os lobos podem viver a espreita do rebanho e, se um lobo aparecer, ele corre. Não arrisca sua vida pelas ovelhas. Um pastor falso chama de ovelha quem é lobo – e isso deixa as ovelhas vulneráveis.

g) O bom pastor chama suas ovelhas pelo nome (vs. 14 a 16) (A terceira marca do verdadeiro Pastor)

Ele as chama e elas se reúnem ao seu redor – note que Cristo não apenas grita ou emite sons peculiares com a boca ou flauta: ele as chama pelo nome. Antes dele chamar já existem as ovelhas que são suas e que lhe atendem o chamado nominal (cf. Is 43.1). Ele as chama individualmente e constitui o seu próprio rebanho. A palavra de Jesus é o centro do chamado.
Geralmente, imaginamos a figura dos filmes de um pastor tangendo suas ovelhas com o auxílio de um cão pastor. Porém, a figura que temos aqui (v. 16) é a do próprio Cristo liderando e suas ovelhas pela sua voz – palavra. Ele é o bom pastor! Ele não permite que suas ovelhas dispersas pelos impostores se percam, mas Ele mesmo as busca e reúne (Ez 34).

III) Aplicações

a) O falso mestre, o sanguessuga e a falsa religião também são ladroes e salteadores. Não é só quem lidera falsamente uma igreja, mas quem dispersa ou desencaminha as ovelhas de Jesus e carrega pessoas para longe do aprisco, desviando as da verdade, ou quem somente suga e mata a igreja.
b) Falsos pastores não permitirão que a voz de Jesus seja ouvida. Usarão de todo tipo de subterfúgio, mas não a pregação fiel que transmite a voz do Supremo Pastor. E aqueles que não são ovelhas de Jesus, que não sabem discernir a voz do pastor da voz do mercenário, recebem o estranho e dão ouvidos aos ladrões e salteadores.
c) Se Cristo é quem dá a vida às ovelhas enquanto os líderes religiosos as sufocavam, inferimos que só serão bons pastores aqueles que direcionam os homens a Cristo. As ovelhas verdadeiras são aquelas guiadas pela Palavra do Supremo Pastor.
d) Somos cooperadores de Cristo quando permitimos que a Sua voz, por meio de sua Palavra, chegue constantemente aos corações. E essa é a grande preocupação dos servos de Jesus: que a sua palavra seja pregada para que as suas ovelhas ouçam sua voz lhe chamando pelo nome. É por isso que Paulo não cansa de repetir velhas verdades, pois, como ele mesmo afirma, “nada considero digno de ser conhecido, senão Jesus Cristo” (1Co 2.2).
e) O ensino de Jesus de Jesus sobre sua entrega vicária em favor de suas ovelhas não é uma discussão que nasce no século 16, ou mesmo nos século IV e V. Naquela época já causava debates (vs. 19 e 20). Mas esse ensino nos dá uma segurança que Cristo mesmo garante às suas ovelhas: ninguém pode nos tirar de suas mãos! (vs. 26-28). Cristo morreu por mim, é a nossa segurança.
S.D.G
——
*Algo similar acontecia no contexto do início da Reforma Protestante. Falsos pastores colocavam sobre o povo o julgo da venda de indulgências. Isso não era feito para garantir a salvação do povo, mas para garantir cofres fartos ao clero. Como lembra a célebre frase de Johann Tetzel, "Tão logo uma moeda na caixa cai, a alma do purgatório sai". Hoje o paralelo é a teologia da prosperidade que, ao contrário de garantir um espaço no céu, faz a falsa promessa de um céu na terra. Ambos os casos, frutos da ganância de pastores infiéis.
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