Vocês têm a mente de Cristo (1Co 2)

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Introdução

Como temos visto até aqui em nossa série, Paulo trata os conflitos da Igreja de Corinto chamando a Igreja a corresponder com sua vocação em Cristo Jesus: a santidade. Ele expõe que suas divisões são infundadas, pois replicam a mentalidade de sua cultura, ao invés de refletir no Evangelho de Jesus e em como a salvação atuou em seu meio.
Paulo lembra que eles foram salvos independentemente da posição intelectual, de poder ou de riqueza. A graça que os alcançou operou por meio da pregação de Cristo, que é para todos os crentes, sabedoria, justiça santificação e redenção. Nele está a nossa glória. E Paulo agora continuará a desenvolver sobre a qualidade da pregação realizada no meio deles e quais as consequências disto para eles.

Exposição

1) O tipo ou a qualidade da pregação que Paulo usou (1-5)

O que ele fez enquanto estava lá: anunciar o testemunho de Deus (v. 1). O método de Paulo era a exposição (Em Tessalônica: At 17.2,3; Em Atenas: At 17.18; Em Corinto At 18.4,5).
Este termo [martyrion tou theou] é disputado, se seria “mistério” ou “testemunho de Deus” mesmo. Independentemente da tradução, Paulo se refere as notícias acerca das obras de redenção através da crucificação de Jesus Cristo. No mesmo trecho, Paulo vai se referir a elas como precisamente mistério [μυστηρίῳ - harmoniza melhor], no verso 7, mas testemunho é possível pois se referiria a pregação (At 18.5), que foi a maneira como esse mistério ou testemunho foi dado: “em palavra e pregação” (4).

i) Como Paulo não fez:

a) com ostentação de linguagem ou de sabedoria (v. 1).
b) nem com linguagem persuasiva de sabedoria (v. 4).
O foco primário da pregação era com o conteúdo: a pessoa e as ações de Cristo. Este era o foco do ensino, ao invés do estilo ou sabedoria humana (e olha que, sendo natural de Tarso, cidade universitária e rival e Atenas e Corinto, ele podia). Entrando, então, no foco de...

ii) Como ele fez:

a) Selecionando o conteúdo essencial: Jesus Cristo e este crucificado (v. 2).
b) em fraqueza, temor e grande tremor (v. 3).
c) demonstração do Espírito e de Poder (v. 4c).
Pense num pacote bonito que está vazio. Não foi essa a lógica de Paulo. Sua pregação tinha o conteúdo correto (Cristo). Sua atitude era de fé na operação do Espírito mesmo diante das improbabilidades evangelísticas (a oposição; aqui, então, fraqueza está em oposição a autoconfiança na retórica- At 18.9, 10). A demonstração de eficácia de sua pregação se dava pela evidente operação do Espírito e de Poder, referindo-se aqui ao que ele vai desenvolver melhor no verso 6: que o Espírito é quem revela a Palavra.

iii) Qual o propósito:

a) a fé não ser apoiar em sabedoria humana, e sim no poder de Deus (v. 5).

2) A sabedoria da Igreja é a sabedoria de Deus

i) A sabedoria particular da Igreja é o evangelho do Senhor Jesus Cristo

Vemos que a exposição de Paulo não foi sem sabedoria (v. 6). Ele falou com os maduros (τέλειος/experimentados - na tradição filosófica é o homem da sabedoria perfeita) com sabedoria. Esses maduros podem ser os crentes, os santos, ou uma ironia: “na verdade, falamos de sabedoria entre os que creem, estes são os verdadeiros sábios. Para eles o evangelho foi sabedoria. Vocês creem? Porque ainda querem ser sábios conforme o mundo?”.
Aqui se distingue que essa sabedoria não foi, como vimos, a sabedoria dos homens (deste século/dos poderosos desta época) que é tão efêmera tanto quanto eles (“que se reduzem a nada”) (v. 6b), sejam romanos, judeus ou espíritos (Jo 12.31).
Esta sabedoria é o evangelho que estava oculto em mistério (v. 7 e 9 - Is 64.4). Ou seja, tudo que os fiéis do Antigo Testamento possuíam eram sombras de um elemento real (Hb 10.1). Promessas, leis, elementos e cerimônias que apontavam para a vinda do Messias. Deus revelou fagulhas de seu plano eterno preordenado e que, no tempo propício, em Jesus Cristo, foram e têm sido perfeitamente desenrolados e cumpridos.
O ponto de Paulo, com isso, é retornar ao argumento: não queiram ser os poderosos deste mundo (1Co 1.26-31). Os poderosos deste mundo mataram o Senhor da Glória (v. 8).

ii) O acesso à sabedoria particular de Deus é dado pelo Espírito

Se Paulo informa aos Coríntios que todos os crentes estão igualados pela graça transmitida pela pregação de Cristo crucificado (1Co 1.21-24), e não por inteligência ou sabedoria humanos, agora ele informa que o acesso a este conhecimento se deu pelo Espírito de Deus (v. 10).
Assim como o nosso espírito nos conhece, o espírito de Deus conhece a Deus (v. 11). É este Espírito Santo, e não o do mundo, que nos tem sido dado e Ele nos revela o que nos foi dado (v. 12). Veja que Ele não revela a si, mas revela o que nos foi dado em Jesus Cristo (Jo 15.26 “Quando, porém, vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade, que dele procede, esse dará testemunho de mim”). Os dons também deverão estar em coerência com isso.

3) Agora nós temos a mente de Cristo (13-16)

i) O ensino do Espírito utiliza a palavra que Ele mesmo revelou (v. 13)

Paulo está evocando aos coríntios a realidade de que, enquanto esteve entre eles, o Espírito Santo agiu através das escrituras, fundamentando a pregação com a palavra (conferindo coisas espirituais - ex.: dons de profecias - com espirituais - as profecias do AT) (v. 13) (2Pe 1.16).

ii) Paulo expõe a tolice de quem eles querem ser (14-16)

Por fim, Paulo vai finalizar a argumentação que levaria os coríntios a uma espécie de constrangimento acerca do pensamento deles. É que eles querem ser* aqueles que não entendem a sabedoria de Deus (v. 14). [*lembrando que antes eles queriam ser quem Deus não escolheu]
É interessante que “homem natural” (ψυχικος) aqui pode ser uma referência ao homem virtuoso aristotélico. Paulo contrasta esse homem com o espiritual. Este homem natural, por mais elevado e sofisticado que possa ser, não aceita as coisas do Espírito de Deus, pois são loucura para ele, e não podem entendê-las, pois não há recursos humanos para isso.
Então, os coríntios deveriam deixar de querer provar algo para o mundo. Não precisavam se submeter a rejeição ou aprovação humana. Na verdade (v 15), eles é quem poderiam julgar o mundo. Julgar aqui é no sentido de discernir (compreender).
Paulo finaliza então, no verso 16, levando os coríntios a refletir que, assim como ninguém instruiu a Deus, pois não pode acessar sua mente, quem não tem a mente de Cristo não pode instruir quem a tem (v. 16). Não é que agora, com a mente de Cristo, podemos instruir a Deus. Não. É que agora, com a mente de Cristo, podemos aceitar as coisas de Deus, podemos entendê-las, ainda que não sejamos compreendidos por ninguém.

Aplicações

1) No evangelho, os simples expositores são poderosos

Irmãos, isso é maravilhoso. É óbvio que, quanto mais estudo teológico aqueles que servem a Igreja tiverem, mais proveito a Igreja terá disto. No entanto, Paulo está nos lembrando: a tarefa do mestre é expor. O que faz um bom pregador, seja a pessoa mais simples do mundo, é trazer para nós o significado da Palavra do Senhor, na dependência do Espírito. São aqueles que oram e labutam. São aqueles que realizam a tarefa santa de usar a tesoura teológica para cortar o desnecessário.

2) No evangelho, os simples crentes são sábios

Vejamos nós: os Coríntios tinham línguas e profecias, mas no dia a dia isso não trazia muito efeito espiritual. Eles tinham a Palavra na boca, mas não tinham no coração, ao ponto de querer serem sábios segundo o mundo. Mas Paulo está mostrando que, por conhecerem a Cristo, o grande mistério de Deus, eles são os mais sábios. Deveras, estes simples de Deus têm o único conhecimento inacessível pela mente natural.

3) O cristianismo é religião de revelação, não de mistério

Há elementos misteriosos na fé, obviamente (mysterium tremedum): as duas naturezas de Cristo, a predestinação e a liberdade, a Trindade. No entanto, no que diz respeito a mensagem proclamada em Cristo para a nossa salvação, ela foi-nos revelada (Cl 2.2). É isso que Paulo enfatiza: Deus nos revelou a Cristo pelo seu Espírito! Quer “entrar no mistério”? Vá conhecer melhor a Cristo.

4) A Igreja tem uma mensagem particular

Há algo que os redutos acadêmicos não têm em suas pesquisa. Há algo que os colegiados políticos não possuem em suas discussões. A sabedoria de Deus revelada no evangelho de Cristo. Este é o assunto particular da Igreja do Senhor (1Co 2.7).
Todos que encontram a verdade, em alguma medida, alcançam o conhecimento de Deus revelado na criação. No entanto, somente no evangelho o homem tem revelado o conhecimento acerca da salvação. E esta revelação especial, sabedoria de Deus, está disponível na Igreja.

5) Você não precisa provar nada para ninguém

Os Coríntios queriam ser compreendidos pelas arenas filosóficas. Queriam não apenas ser razoáveis, mas serem identificados como sofisticados, eruditos, eloquentes e poderosos. Mas eles seguiam o crucificado. Não deveriam viver pelo temor dos homens. Não tinham apenas uma nova identidade (vocação), como vimos na última pregação, eles tinham uma nova mente. Poderiam, à medida que pela fé conheciam a revelação de Deus, analisar e compreender com mais acurácia todas as coisas. Ainda que sem compreender tudo, poderiam se dobrar em reverência e louvor. Não importa o que o mundo pense, nós devemos ser fiéis. É a Deus que prestamos contas, e não a nós mesmos ou a outros.
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S.D.G

13 Quem entre vós é sábio e inteligente? Mostre em mansidão de sabedoria, mediante condigno proceder, as suas obras. 14 Se, pelo contrário, tendes em vosso coração inveja amargurada e sentimento faccioso, nem vos glorieis disso, nem mintais contra a verdade. 15 Esta não é a sabedoria que desce lá do alto; antes, é terrena, animal e demoníaca. 16 Pois, onde há inveja e sentimento faccioso, aí há confusão e toda espécie de coisas ruins. 17 A sabedoria, porém, lá do alto é, primeiramente, pura; depois, pacífica, indulgente, tratável, plena de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem fingimento. 18 Ora, é em paz que se semeia o fruto da justiça, para os que promovem a paz.

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